quinta-feira, 4 de março de 2010

Sobre Amizade e Outros Valores...

A vontade de escrever sobre temas extra-musicais sempre me consumiu: quando pequena, eu escrevia redações, livros, histórias, poemas, cartas e uma infinidade de letras que formam meu universo literário particular. Um belo dia, perguntei a mim mesma, porque nunca tinha colocado essa idéia em prática. Sério, eu não soube responder, porque não tinha porque não pôr essa idéia em prática (desconsidero o fato de eu ter surtos “nunca mais vou escrever”), visto que a inspiração é diária e vem de momentos cotidianos: desde “andar pela sombra” num dia quente, até “porque os bebês se sentem sozinhos” quando estão internados. Logo, tem assunto pra dar e vender. Dá pano pra manga. Imaginação fértil, de quem mora no país das maravilhas e vem tirar férias básicas no mundo real pra se indignar contra a dura realidade. Hoje, aproveitando que resolvi “tirar o atraso” literário, e voltei a escrever no blog sobre música, depois de quase dois meses ausente, pensei: está chovendo, frio e eu estou mesmo de dieta e sozinha, porque não começar a escrever, vai que sai algo bom?

Ok, isso não é um argumento sustentável e nem estou me vitimizando, até porque sou uma pessoa privilegiada: estou com as meias mais quentinhas do mundo, com uma sopa quentinha e deliciosa ao meu dispor, em casa, de bobeira, numa noite fria. Mas tem algo que me incomoda, e eu preciso eviscerar: amizade verdadeira existe nos dias de hoje? É sobre o que eu quero falar hoje. Razões? Deixo para o final. Mas esse assunto é um daqueles que dá pra falar mil vezes sem esgotar o leque de possibilidades.

Será que a amizade nos dias de hoje tem o mesmo valor que antigamente? Há alguns anos atrás, era comum as pessoas terem amizades de infância pela vida toda, e hoje em dia, fica cada vez mais raro esse tipo de afeto presente na vida corrida e descompromissada com as relações, onde cultivamos a nossa solidão.

Eu gostaria de reviver o sentido da amizade, aquela onde o altruísmo sobrepõe o egoísmo, onde o coletivo toma a liderança e a cumplicidade é vista como honra e não como título de burrice. Como seria um mundo onde não pudéssemos confiar e contar com ninguém? Prefiro não saber, mas desconfio que estamos nos imergindo progressivamente nele, tão lentamente, que quando nos dermos conta, estaremos afogados num mar de egos em competição.

Lembro do meu primeiro dia na escola nova, onde eu ia para o Jardim. Estava assustada, pois era uma escola enorme que tinha até nível superior, e antes, eu estudava num jardim escola de fundo de quintal. No primeiro dia, assustada, num cantinho, lembro de uma menina que sentou do meu lado e me ofereceu metade do refrigerante dela pra mim. E ficamos amigas, e eu lembro do rosto dela até hoje, apesar não tê-la visto mais, ao mudar de escola. Parece algo pequeno, mas hoje em dia, as crianças são treinadas para não dividirem suas coisas e pensarem antes em si próprias. Cuidado: Quem cria monstros, pode se tornar alvo deles. Crianças filtram e absorvem tudo ao redor, temos que ter cautela e pisar em ovos quando quisermos dar um exemplo, na forma como passamos os nossos valores.

Voltando ao exemplo do refrigerante dividido, onde eu tinha cinco anos, e sim, me lembro bem disso, pois era muito mais fácil cativar uma amizade, numa época onde éramos mais fraternais e nos tratávamos como irmãos: dividíamos tudo e tudo era festa. É preferível ter pouco e dividir, e nos alimentarmos de sentimentos também, do que ficarmos isolados em nosso castelo, sem ter pra quem mostrar todo nosso ouro.

Eu tenho amigos que não tem idéia do quanto são meus amigos, nem tem noção de como me são especiais, raros, caros e como me sinto afortunada por tê-los, nesse caótico mundo de sentimentos descartáveis, onde ganhar dinheiro e ter poder se tornaram prioridade em detrimento do “ser alguém com princípios”.

Se eu pudesse fazer tudo por eles, faria sem pestanejar. Eu aprenderia a voar, ou me conformaria em ter os pés no chão. Eu só gostaria de estar presente no melhor e no pior momento da vida deles, porque é preciso reconhecê-los em suas vitórias e nos reconhecermos como parte de suas tragédias, visto que a dor é subtraída na mesma proporção que a felicidade se multiplica. Quem diria, é matemática pura. Sem razão, mas tem lógica: a união faz a força. E um mais um consegue ser igual...a um. Uma só alma com dois corpos, dois corações em uma só sintonia.

Vá entender, eu desisto, mas aceito e comemoro: quem inventou um sentimento onde o predomínio é o altruísmo, onde você pode ser exclusivo para alguns e único pra todos eles, e você se sente leve ao transbordar sua alma para além de si mesmo, merece um pedestal, e o meu reconhecimento. Respondendo e justificando minhas razões para falar sobre amizade? Não tem explicação, e nem acabou por aqui. Mas eu me sinto privilegiada por poder contar em mais de uma mão, os meus afetos sinceros, que eu guardo na parte mais nobre que há em mim. E me sinto vulnerável e triste quando não posso corresponder à uma expectativa, ou não estou presente como gostaria. Mas em pensamento, estamos juntos, sempre, em tão harmoniosa sintonia, que eu poderia tocar seu coração. O mundo é melhor, porque você existe. Jamais esqueça disso.

By Nine

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